Novo Marco Legal do Saneamento Básico completou dois anos, mas poucos foram os avanços até agora
Dados do Atlas do Saneamento, elaborado pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelam que a falta de
saneamento básico no Brasil foi responsável pela morte de pelo menos 135 mil
pessoas entre 2008 e 2019. Esses óbitos são uma consequência das Doenças
Relacionadas ao Saneamento Ambiental Inadequado (DRSAI).
No período, foram registrados mais de 11 milhões de
casos de DRSAI no Brasil, com quase 5 milhões de internações no Sistema Único
de Saúde (SUS). As principais causas de morte, com cerca de 82% do total, são
Doença de Chagas, diarreias e disenteria. Também existe alta incidência de
Dengue, zika e chikungunya como causa das mortes nas regiões Sudeste e
Centro-Oeste; de leishmanioses na Região Norte; de esquistossomose na Região
Nordeste e a leptospirose na Região Sul.
O Atlas do IBGE aponta que houve avanços no número de municípios cobertos por esses
serviços em todas as regiões do país, entre 2008 e 2017. Mesmo assim, apenas
São Paulo, Rio de Janeiro e Distrito Federal apresentam taxas superiores a 85%
de domicílios atendidos pelo serviço de coleta de esgoto. E este é um problema
mundial. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) revelam que 88% das mortes
pela doença no mundo são causadas pelo saneamento inadequado.
Legislação e propostas
No Brasil, o Marco Legal do Saneamento Básico (Lei
nº 14.026, de 15/07/2020) atualiza a legislação desse setor e atribui à Agência
Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) a competência para editar normas de
referência sobre o serviço de saneamento. Entre os princípios básicos do Novo
Marco estão a prestação regionalizada dos serviços, com vistas à geração de
ganhos de escala e à garantia da universalização; seleção competitiva do
prestador dos serviços; e prestação concomitante dos serviços de abastecimento
de água e de esgotamento sanitário.
Mundialmente, os Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável (ODS), definidos pela
Organização das Nações Unidas (ONU) colocam o saneamento entre os
objetivos mensuráveis e universalmente acordados para combater a pobreza
extrema e a fome, prevenindo doenças mortais. A emergência sanitária global,
iniciada em 2019, também colocou no foco das prioridades públicas mundiais o
saneamento básico, uma vez que o combate à Covid-19 passa, necessariamente,
pelas condições de higiene das mãos e, portanto, pelo acesso da população à
água de boa qualidade, o que requer olhar a questão do saneamento sobre vários
ângulos de análise.
Apesar disso, e ainda que o Novo Marco Legal do
Saneamento tenha sido sancionado há dois anos, quase 35 milhões de pessoas no
Brasil ainda vivem sem água tratada e cerca de 100 milhões não têm acesso à
coleta de esgoto, de acordo com informações da Agência Senado. Segundo a 14ª
edição do Ranking do Saneamento, publicado pelo Instituto Trata Brasil, em
parceria com a GO Associados, o cenário atual mostra que somente 50% do volume
de esgoto do país recebe tratamento. Municípios dos estados do Paraná, São
Paulo e Minas Gerais ocupam as primeiras posições do ranking, liderados por Santos
(SP). Entre os 20 piores estão municípios da região Norte, alguns do Nordeste e
Rio de Janeiro. A última posição é ocupada por Macapá (AP).
De acordo com a publicação Política e Plano
Municipal de Saneamento Ambiental – Experiências
e recomendações, publicada pelo Ministério da Saúde, uma das formas encontradas
para fortalecer os municípios no que tange a melhora dos serviços de saneamento
básico, está na elaboração de uma Política Municipal de Saneamento Ambiental,
de forma participativa e democrática, que considere os princípios de
universalidade, equidade, integridade e controle social. “É uma oportunidade
também para que o município que não presta diretamente os serviços, ainda que
responsável pelos serviços de saneamento, venha a iniciar uma nova forma de
diálogo e relação com a empresa concessionária dos Serviços de Abastecimento de
Água e Esgotamento Sanitário, exercendo seu poder concedente”, assinala um dos
autores do estudo, Luiz Augusto Cassanha Galvão, então Gerente da Área de
Desenvolvimento Sustentável e Saúde Ambiental da Organização Pan-Americana da
Saúde.
Hoje, a ANA tem a atribuição de editar normas de
referência, regras de caráter geral que
devem ser levadas em consideração pelas agências reguladoras de
saneamento infranacionais (municipais, intermunicipais, distrital e estaduais)
em sua atuação regulatória. Para que o Brasil consiga universalizar os serviços
de esgotamento sanitário no Brasil, com base no horizonte de planejamento de
2035, o Atlas Esgotos: Despoluição de Bacias Hidrográficas, da própria ANA e da
Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental, aponta que são necessários
investimentos de R$ 149,5 bilhões, dos quais R$ 101,9 bilhões precisam ser
aplicados em coleta de esgotos, enquanto R$ 47,6 bilhões devem ser empregados
no tratamento. No Brasil há 60 agências infranacionais atuando no setor de
saneamento, sendo 25 estaduais, uma distrital, 28 municipais e seis
intermunicipais. Em termos de abrangência, aproximadamente 65% dos municípios
brasileiros estão vinculados a essas entidades.
Seja como for, é preciso adotar medidas urgentes. Um
estudo publicado pelo Instituto Trata Brasil, também com base nos dados da OMS,
revela que o investimento em água potável e saneamento básico pode resultar em
benefícios econômicos superiores a 30 vezes o valor aplicado. Porém, o aspecto
mais importante nesta conta é que as populações com acesso a esses benefícios
adoecem menos e podem ter uma vida mais produtiva.