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A agonia dos centros de saúde

Publicado em 15/06/2016 • Notícias • Português

A partir dos anos 1970, os centros de saúde passaram a nortear o desenvolvimento da saúde pública. Na década seguinte, mais de 40 unidades foram construídas na capital federal a partir de um modelo importado da Inglaterra. Quase quatro décadas depois, a estrutura carece de investimentos. A intenção do governo é fortalecer o setor com a implantação das organizações sociais na gestão. No total, são 66 desses locais no DF. Desses, três estão desativados para obras — os reparos deveriam ter ficado prontos em 2014.

Com a adaptação, serviços básicos, como clínica médica, ginecologia, pediatria, entre outros, passaram a aproximar a assistência médica da população, antes centralizada nas especialidades hospitalares. Em entrevista ao Correio, publicada no domingo, o secretário de Saúde, Humberto Fonseca, informou que a atenção primária cobre apenas 30,7% dos habitantes do DF, e a administração direta não é suficiente para expandir os atendimentos (leia reportagem ao lado).

O Executivo local encontra dificuldade para manter as atividades funcionando com iniciativas que caducaram no tempo. A Secretaria de Saúde não sabe precisar quantos espaços passam por reformas de manutenção predial, apesar de reconhecer que todos necessitam de restauração e não comportam grandes investimentos tecnológicos. A ausência de edifícios próprios impõe ao governo alugar 30,3% dos pontos onde funcionam centros de saúde. No total, 20 unidades são locadas.

“Burocracia”

Apenas na restauração dos centros de saúde Nº 5 do Lago Sul, Nº 8 do Gama e Nº 11 de Ceilândia, o governo gastou R$ 2.065.612 (35%), e as construções estão previstas para ficarem prontas entre setembro e outubro, após dois anos de atraso. No total, o governo desembolsará R$ 5.814.000. No caso do Gama, distante 35km do Plano Piloto, a empreitada tem somente 18,7% do projeto concluído. Em Ceilândia, o volume atinge 28%. “As obras estão paradas por falta de pagamento. Nós somos a terceira empresa a tocar esses empreendimentos”, disse o responsável pelos canteiros, que não quis ser identificado.

A justificativa do subsecretário de Logística e Infraestrutura (Sulis) da Secretaria de Saúde, Marcello Nóbrega, é ancorada no arrocho financeiro de 2014. Ele critica a “burocracia” para se aprovar os projetos, que pode chegar até três anos. “As obras param o fluxo quando não recebem dinheiro. A crise se reflete até hoje. Trabalhamos com um regime de parceira com outras secretarias e dependemos de muitas aprovações. Existe uma influência negativa de um procedimento que não é célere”, reclama.

Peregrinação

Da janela da sala, a professora aposentada Maria de Lourdes Leite, 70 anos, acompanha o enredo do Centro de Saúde Nº 8 do Gama. Ela passou de paciente assistida a espectadora de uma reforma sem fim. Na última remarcação de data, a entrega da unidade estava prevista para 26 de maio. “O atendimento era muito bom, apesar de ser uma estrutura antiga. Os profissionais eram ótimos. Eu pegava remédios para hipertensão e colesterol alto”, relembra a idosa. A distância entre o prédio onde Maria mora e a entrada do local desativado tem menos de 100m. “Hoje, eu levo quase 40 minutos para chegar ao Centro de Saúde Nº 5 do Gama”, reclama.

Quem passa desatento pela QI 23 do Lago Sul não percebe o Centro de Saúde Nº 5. Não há nenhum tipo de identificação na unidade médica. Na entrada, as folhas secas tomam conta do espaço. Latas de tinta, restos de material de construção e até uma cadeira de consultório estão abandonados no pátio. Gente, além do vigilante da obra, é raro de se ver. “Está com três anos que esse espaço está fechado. Muita gente vinha do Paranoá e de São Sebastião, frequentavam bastante”, afirmou uma mulher que caminhava pelo local.

Vitor Gomes Pinto, especialista em saúde pública e integrante do Observatório da Saúde, critica os “problemas costumeiros” das estruturas. “Tirando as unidades de pronto atendimento (Upas), sobram muito poucas obras novas. O diagnóstico é de uma estrutura amplamente ruim, que sofre com o desgaste do tempo e falhas costumeiras”, avalia.

O clínico-geral Tiago Souza Neiva explica que os centros de saúde fazem parte da atenção primária, que é um sistema fragmentado, segundo o especialista. “A solução é que cada ente esteja ocupado com a sua vocação preferencial e a sua competência original. Essa lógica está invertida há muito tempo; por isso, desgasta os serviços e equipamentos. Precisamos de um modelo que a atenção primária seja verdadeiramente qualificada”, detalha o médico que atende no Centro de Saúde Nº7 da Granja do Torto há 5 anos.

Fonte: Correio Braziliense

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