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Autoridade da Anvisa fica fragilizada com precedente inaceitável

Publicado em 15/04/2016 • Notícias • Português

Ninguém pode sustentar a tese de que pessoas doentes não têm direito de decidir livre e autonomamente sobre os rumos que pretendem dar às suas vidas.O direito à livre escolha fica ainda mais evidente no caso do câncer, quando não existem terapias com altas taxas de cura para todos os tipos de tumores.
Discussões como as que envolvem a fosfoetanolamina são frequentes em várias partes do mundo e em muitos momentos da história.Cabe lembrar os recentes debates locais sobre as drogas perigosas usadas para emagrecer e o canabidiol. O filme “O Óleo de Lorenzo” (1992)refere-se a um fato semelhante ocorrido nos EUA.
No caso da fosfoetanolamina, alguns dos atores envolvidos desempenharam papéis desastrosos e não ajudaram a equilibrar as expectativas da sociedade Com aparente conivência da USP, o professor Gilberto Chierice produziu irregularmente cápsulas da substância por mais de 20 anos nos laboratórios da instituição.
Apesar de sua experiência como cientista e do tempo que teve, optou por não adotar os procedimentos usuais para converter seus experimentos em possibilidade concreta de tratamento de câncer.
Ao invés de se ocupar com o desenho e a realização dos estudos necessários para comprovar suas alegações, o professor transferiu para a esfera política, por meio de um parlamento mergulhado numa crise de popularidade e ávido por temas com alto apelo social,o desfecho sobre a possibilidade de uso do produto.
Um assunto de tamanha sensibilidade, desviado da esfera técnico-científica para a esfera política em tempos de turbulência, gera constrangimentos que levam as autoridades a abandonarem a necessária cautela e deixarem de lado a análise das consequências de seus atos. Em um prazo incomum (menos de seis meses), o Congresso Nacional fez tramitar e aprovou a lei. Apesar dos pareceres contrários das esferas técnicas,alei foi sancionada e publicada sem vetos pelo Poder Executivo.
Pessoas poderão ser lesadas ao utilizarem um produto sem efeito algum ou capaz de gerar mais danos do que benefícios ao organismo já doente, levando empresas à incorrerem em crimes contra a saúde pública. Os padrões do sistema regulatório brasileiro sobre medicamentos serão internacionalmente questionados e a autoridade da Anvisa, como órgão técnico de regulação,fica fragilizada mediante um precedente inaceitável.
Trata-se de um preço muito elevado para o aprendizado sobre o significado temporal da ciência,a responsabilidade ética dos cientistas, a construção do conhecimento científico, o respeito às decisões individuais, o amparo às pessoas em situações de fragilidade e o papel do Estado no equilíbrio das expectativas da sociedade. Parece que avançamos para trás.

Fonte: Folha de S.Paulo

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