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Déficit e greves afetam serviços básicos no Rio

Publicado em 25/04/2016 • Notícias • Português

O Estado do Rio de Janeiro terminou os dois primeiros meses de 2016 com um déficit de R$ 3,66 bilhões nas contas públicas. De um total de R$ 11,8 bilhões em compromissos financeiros assumidos até fevereiro, foram liquidados apenas R$ 8,45 bilhões. O abismo existente entre as necessidades de caixa e o total de recursos disponíveis se traduz hoje num cenário paralisia de serviços públicos básicos, com 17 categorias de servidores estaduais em greve.

Os restos a pagar – despesas assumidas, mas não quitadas até 31 de dezembro de 2015 – totalizavam R$ 4,35 bilhões no fim de fevereiro. Só na área de saúde há R$ 1,4 bilhão em dívidas com fornecedores não quitadas ao longo do ano passado. “Vivemos uma situação de absoluto caos na saúde do Rio e ainda vai piorar”, afirma Nelson Nahon, vice-presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (Cremerj).

“Atualmente, o Rio tem um déficit diário de 150 a 200 leitos de CTI [centros de terapia intensiva] para adultos”. Os repasses a hospitais privados que fornecem leitos em UTIs neonatais – cerca de dois terços da rede – estão seis meses atrasados, diz Nahon.

Ao assumir a pasta em janeiro, o secretário estadual de Saúde, Luiz Antonio de Souza Teixeira Júnior, repactuou compromissos financeiros assumidos pelo Estado. “Mas mesmo esses valores repactuados não foram cumpridos”, admite o secretário. No caso das 14 Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) municipais, nas quais o governo estadual tem o compromisso de aportar mensalmente R$ 400 mil por unidade, os pagamentos foram suspensos há um ano. Tomando por base esse valor, a dívida seria de quase R$ 5 milhões por unidade. A previsão é que o pagamento dos atrasados comece este mês, mas o valor por UPA foi renegociado para R$ 200 mil.

Desde o início do ano, o governo liquidou R$ 1,66 bilhão em restos a pagar processados (aptos para pagamento). De acordo com a Secretaria de Fazenda, o restante do passivo – R$ 4,35 bilhões – deverá ser liquidado “em sincronia com o fluxo de caixa e as prioridades governamentais”. O desafio é proporcional ao déficit previsto para este ano no Estado, da ordem de R$ 19 bilhões.

“Nosso problema é aumentar a receita”, diz Julio Bueno, secretário de Fazenda do Rio, reconhecendo que o descompasso entre receitas e despesas não será resolvido apenas com cortes orçamentários. Na prática, as fases de empenho (reserva de recursos para pagamento da despesa), liquidação e pagamento efetivo não ocorrem simultaneamente. O intervalo entre elas pode se estender de 30 a 45 dias, o que, no quadro atual, significa um alívio mínimo para o caixa estadual.

O esforço no sentido de aumentar a arrecadação incluiu a alteração de alíquotas aprovadas no fim de 2015, além da modernização de procedimentos de fiscalização e sistemas de acompanhamento. Os resultados por enquanto são tímidos. Nos dois primeiros meses do ano, a arrecadação de ICMS no Estado somou R$ 5,54 bilhões. Na comparação com os números disponíveis no site do Conselho Nacional de Política Fazendária, o total é apenas 0,8% superior ao registrado no primeiro bimestre de 2015, sem considerar a inflação no período.

“Mesmo se cortar todas as despesas de custeio, não consigo resolver [o déficit]”, argumenta Bueno. Em linhas gerais, o gasto com a máquina estadual é de R$ 7 bilhões por ano, enquanto a folha de pessoal ativo consome R$ 26 bilhões. O pagamento de servidores inativos absorve R$ 17 bilhões. “O regime previdenciário está demolindo as contas do Estado”, explica Istvan Kasznar, professor da Ebape-FGV.

No primeiro bimestre do ano, do total de R$ 8,45 bilhões em despesas liquidadas, 45,5% corresponderam a gastos do Estado com previdência. “Para solucionar o Brasil, tem que resolver a previdência”, diz Bueno. O excessivo peso financeiro da folha de inativos agravou a crise no Estado, deflagrada pela queda nos preços do barril de petróleo e pela redução nos investimentos da Petrobras, atingida pelas investigações da Operação Lava-Jato.

Kasznar, da Ebape-FGV, critica a dependência excessiva do Rio em relação à estatal: “A empresa representa entre 37% e 38% do PIB estadual. Não existe sustentabilidade na formação da receita do Estado. Não há como o Estado se recuperar sem o saneamento da empresa.”

Consequência da crise financeira, o atraso no pagamento de salários fez explodir o número de greves entre os servidores municipais. No dia 6 deste mês, 33 categorias do funcionalismo estavam de braços cruzados. O número havia caído quase pela metade até quarta-feira, mas categorias que prestam serviços essenciais – como a dos professores estaduais – continuam em greve. Entre outras reivindicações, os docentes pleiteiam um aumento salarial de 30% que – segundo o Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do Rio de Janeiro – serviria para recompor perdas ocorridas desde 2006.

“Onde houver impacto financeiro, não vai haver avanço nas negociações”, afirma Caio Castro Lima, chefe de gabinete da Secretaria de Estado de Educação. “Cada 1% de reajuste para o magistério representa R$ 29 milhões de impacto financeiro no orçamento. Um aumento de 30% representaria gastos adicionais de R$ 870 milhões.

Além da greve iniciada em 2 de março, a secretaria está às voltas com a ocupação de colégios públicos por estudantes que apoiam a paralisação dos professores. A Escola Estadual Prefeito Mendes de Moraes, na Ilha do Governador, zona norte do Rio, foi a primeira a ser ocupada, no dia 21 de março. O movimento ganhou força em abril: saltou de 36, no dia 14, para 62 no fim da tarde de quarta-feira.

“A pauta dos alunos é a dos professores”, diz Lima. De fato, as reivindicações dos estudantes têm diversos pontos em comum com a pauta dos docentes, como a abolição do currículo mínimo e do Saerj, sistema de avaliação da educação vigente no Estado. “Se os professores encerrarem a greve deles, provavelmente vamos desocupar o colégio”, diz Pedro Bezerra, 16 anos, um dos cerca de 30 alunos que ocupam a Prefeito Mendes de Moraes.

Fonte: Valor Econômico

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