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O mundo do Crispr

Publicado em 25/04/2016 • Notícias • Português

Uma nova ferramenta de edição genética capaz de mudar completamente o mundo que conhecemos cada vez mais perde o rótulo de promessa e ganha o de “realidade”.
O nome da técnica é Crispr Cas 9 (lê-se crísper-cás-nove) e ela reúne características que surpreendem até mesmo os biologistas mais experientes e está para o genoma assim como um processador de texto está para as palavras e frases de uma redação.
Simplificadamente, agora é possível eliminar partes indesejadas do genoma —que causam doenças— e, se necessário, inserir novas sequências no local.
A taxa de sucesso, quantidade de células modificadas pela técnica, é muito maior que aquela de outras antigas, usadas em experimentos de terapia gênica, por exemplo.
Antes, eram oferecidos genes inteiros para células doentes na esperança de que elas os acolhessem e os incorporassem.
A maquinaria de edição do Crispr permite atuar diretamente no gene defeituoso, como um míssil teleguiado, atingindo um grande número de células-alvo.
Na técnica, a enzima Cas 9, uma nuclease, corta as duas fitas da dupla hélice do DNA, abrindo espaço para a inserção, se for o caso, de um novo trecho (veja infográfico).
Agora também é possível uma edição “sem corte” do DNA —útil para alterar uma única “letra” do genoma.
A novidade está na última edição da revista “Nature”.
Mutações de uma única“letra” causam doenças como anemia falciforme e aumentam propensão a alguns cânceres.
No caso da distrofia muscular de Duchenne, doença progressiva e letal, a técnica poderia beneficiar 80% dos pacientes, ao cortar fora um trecho “errado” do DNA das células musculares.
As possibilidades são infinitas.
Recentemente, cientistas mostraram, usando o Crispr,ser possível“empurrar” mosquitos vetores de doenças (como o anopheles, da malária e o aedes, da dengue e da zika) rumo à extinção ao favorecer a herança de genes letais entre as fêmeas.Outro exemplo icônico é experimento que extirpou o HIV de uma cultura de células humanas.
Para entender o possível impacto do Crisprede outras futuras técnicas de manipulação genética,tem de se ter em mente que humanos, vacinas, agropecuária, vacinas —todo o mundo vivo ou que depende dele— estão na mira.
Células embrionárias podem ser modificadas para um bebê não ter fibrose cística, distrofia ou propensão ao diabetes e à obesidade.
Bactérias capazes de degradar de poluentes, como óleo, podem ser aperfeiçoadas.
Plantas com altíssima capacidade de sequestro de carbono (capazes de atenuar o aquecimento global) podem estar logo ali, alguns anos adiante.
Com relação à saúde, não é uma técnica que apenas eliminaria uma bactéria ou vírus, mas que teria potencial de arrumar tudo o que está “errado” na célula. Saber o que é “errado” envolve uma grande discussão bioética, porém.
Cientistas de várias partes do mundo estão em uma espécie de corrida armamentista para ver quem consegue ir mais longe como Crispr. Uma preocupação é quando o primeiro bebê-Crispr nascerá.
Houve até proposta de “trégua”na área,da cientista Jennifer Doudna, da Universidade da Califórnia,em Berkeley.
A ideia de Doudna seria a de que houvesse diretrizes,ou, ao menos, um “guia de boas práticas”para quem estivesse usando a ferramenta em células embrionárias humanas.No Reino Unido, por exemplo, já há pesquisas com embriões humanos coma finalidade de melhorar o desempenho da reprodução assistida.
DINHEIRO O Crispr não é uma invenção humana e o acrônimo significa“repetições palindrômicas curtas agrupadas e regularmente inter espaçadas”.Originalmente,trata-sede um recurso utilizado por organismos unicelulares contra a invasão de vírus.A transformação desse conhecimento em técnica genética só ganhou importância no início desta década.
Doudneresua colega Emmanuelle Charpentier iniciaram o processo de patenteamento em 2013, pouco antes de Feng Zhang, do Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT)fazer o mesmo por uma via menos burocrática.
Zhang teve sucesso, e iniciou-se uma disputa institucional e pessoal para ver quem é o dono do Crispr. Dada a gama de possíveis aplicações, o potencial de exploração econômico da técnica é incalculável.O mundo ainda aguarda a decisão da justiça americana.
Por ora, já existem empresas explorando o potencial do Crispr e engordando a conta de Zhang. Só neste mês de abril, a Intella Therapeutics, joint venture da qual participa a farmacêutica Novartis, deve captar quase US$ 120 milhões em investimentos. Outra empresa, a Editas Medicine, levantou US$ 94 milhões em sua oferta pública inicial.
Mesmo com a briga judicial,provavelmente o risco do negócio vale a pena.

Fonte: Folha de S.Paulo

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