Saúde que não cabe nos planos
Publicado em 14/02/2018 • Notícias • Português
Com a atual desesperança no sistema público de saúde e o alto custo do sistema privado, muitas pessoas buscam convênios médicos para garantir que, caso necessário, possam ter acesso à assistência médica. No entanto, o que deveria trazer alívio, muitas vezes, traz dor de cabeça quando os beneficiários se depararam com situações em que a empresa contratas traz mais impedimentos do que soluções.
A estudante Juliana Lima, 21 anos, relata que sofre de problemas na coluna e precisaria fazer uma cirurgia para redução dos seios. Ela aderiu a um plano de saúde para realizar todo o tratamento, entretanto, a operadora não autorizou os procedimentos. “O consultor de vendas informou que, apesar de ser um plano ambulatorial, eu poderia fazer a redução. Tentamos conseguir a liberação desde que eu tinha 18 anos, e, mesmo com encaminhamento médico, a empresa não autorizou nenhum procedimento ligado ao meu problema”, lamenta.
Os dissabores com as operadoras não se limitam, entretanto, a solicitações não autorizadas. Segundo o Índice Geral de Reclamações (IGR), 32% das queixas registradas em outubro do ano passado foram relacionadas ao gerenciamento das ações de saúde por parte da operadora, como autorizações prévias e franquias. Procedimentos e coberturas registraram 12,4% das queixas, enquanto reembolsos, 9,8% do total; prazos máximos para atendimento, 9,7%; suspensão e rescisão contratuais, 9,3%; rede conveniada de atendimento, 7,5%; mensalidades, 3,5%; e outros problemas, 15,6%.
“A maioria das reclamações que recebemos é ligada à cobertura assistencial, isso porque muitos planos são antigos, não possuem cobertura pelo Rol de Procedimentos ou não foram adaptados à lei”, relata Luiz Fernando Moreira, advogado especializado em direito da saúde. “Questões ligadas a contrato e à carência também são frequentes e comumente levam a processos até ao Superior Tribunal de Justiça”, reconhece.
Mesmo que o cliente tenha um problema de saúde, as empresas não podem cobrar taxas de adesão ou se recusar a vender planos. De acordo com o especialista, se o beneficiário apresentar enfermidade antes da compra do convênio médico, a operadora pode fazer uma cobertura parcial temporária. Nesse caso, é estabelecido prazo de carência de até 24 meses, período em que o consumidor não terá acesso à UTI, a processos de alta complexidade ou a cirurgias ligadas ao problema.
“Na hora de contratar um plano de saúde, é fundamental que o beneficiário leia o contrato, no lugar de se basear nas informações prestadas pelo consultor de vendas, além de tirar as dúvidas, consultando um advogado, se necessário”, explica Moreira. “Infelizmente, as pessoas podem ser mal-intencionadas, ainda mais considerando que muitos corretores querem apenas vender o plano por pensarem que não encontrarão mais o cliente e, portanto, não haverá consequências”, acrescenta.
O advogado sugere que, durante a negociação, o beneficiário peça ao corretor que acrescente, por escrito, as promessas feitas e assine o contrato contendo esses dados. “Assim, na hipótese de um atendimento ou procedimento recusado, ele pode provar legalmente o que foi acertado durante a compra do plano tanto para a operadora quanto legalmente, se houver processo judicial”, orienta.
Coberturas
Um plano de saúde é composto por coberturas assistenciais, que variam conforme previsto no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde. Exames e tratamentos que compõem o rol devem ter cobertura obrigatória pelos convênios. As coberturas assistenciais se estendem para cinco segmentos: ambulatorial, hospitalar com ou sem obstetrícia, referência e odontológica.
A cobertura ambulatorial consiste em prestação de serviços ligados ao ambulatório, como consultas médicas. Se o procedimento médico exigir internação em hospital, ainda que abaixo do tempo definido, o cliente não terá direito a fazê-lo pelo plano. Cabe à operadora transportar o paciente até uma unidade do Sistema Único de Saúde (SUS) que tenha disponibilidade para realizar o tratamento. Para atendimentos dentários de urgência ou emergência, o plano deve ser odontológico.
A cobertura hospitalar conta com duas versões: uma com e outra sem obstetrícia. Ambas garantem a prestação dos serviços ligados à internação hospitalar e não há limite de tempo para internações após o período de carência. Na opção com obstetrícia, há cobertura assistencial ao filho recém-nascido do contratante, seja biológico ou adotivo, pelo primeiro mês após o parto. Durante o período de carência, no entanto, as regras são as mesmas da cobertura ambulatorial, com limite de 12 horas para atendimentos de emergência.
Os planos com cobertura referencial trazem tanto a assistência ambulatorial quanto a hospitalar, com obstetrícia e acomodação em enfermaria. Instituído pela lei nº 9.656/98, estipula que o beneficiário tenha atendimento integral de urgência e emergência após 24 horas da sua contratação. Garante acesso e atendimento por profissionais ou serviços de saúde, livremente escolhidos, integrantes ou não de rede credenciada, contratada ou referenciada, a ser paga integral ou parcialmente pela operadora, mediante reembolso ou pagamento direto ao prestador, por conta e ordem do consumidor.
Após o período de carência, há prazos máximos para fornecer atendimento. Serviços de diagnóstico ambulatorial por laboratório, por exemplo, têm prazo de três dias úteis, enquanto procedimentos de alta complexidade contam com 21 dias úteis. “No caso da empresa não cumprir o prazo ou recusar o atendimento, o cliente pode exigir uma justificativa da operadora por escrito e utilizar esse documento para entrar em contato com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que fará a apuração”, aconselha Moreira.
“Outro problema é a dificuldade em manter os planos, conforme os reajustes são feitos, principalmente de acordo com faixa etária”, observa o advogado. Os reajustes só podem ser feitos anualmente, na data de vencimento do contrato, ou por mudança de faixa etária, sendo o primeiro aos 19 anos do consumidor. A partir de então, o valor é aumentado de cinco em cinco anos até que o cliente complete 59 anos, quando o reajuste pode chegar até 70%.
É possível consultar os procedimentos, exames e tratamentos de cada cobertura assistencial no site da ANS, pelo endereço https://goo.gl/WQq8eC. O beneficiário pode, também, tirar dúvidas e fazer reclamações tanto pela Central de Atendimento ao Consumidor da agência, quanto pelo link https://goo.gl/KGwfdP, e pelo número 0800-701-9656. A página contém uma lista com os contatos das ouvidorias de todas as operadoras.
* Estagiária sob a supervisão de Margareth Lourenço (Especial para o Correio)
Comportamento
Indicador criado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) tem como principal finalidade apresentar o comportamento das operadoras do setor no atendimento aos problemas apontados pelos clientes. Contempla o número médio de reclamações recebidas nos três meses anteriores e classificadas até a data de extração do dado.
O que diz a lei
De acordo com o Art. 35-C, do código de defesa do consumidor, a cobertura do atendimento é obrigatória para todas as modalidades de plano de saúde em casos de urgência, emergência e planejamento familiar, mesmo que o beneficiário ainda esteja no período de carência do seu plano. Os casos de emergência são aqueles que implicam risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente. As urgências são resultantes de acidentes pessoais ou complicações no processo gestacional. Ambos são limitados à unidade de pronto-socorro e até 12 horas.
Fonte: Correio Braziliense