Impacto deve ser maior que os 18% de reajuste do ICMS, avaliam entidades
Publicado em 23/01/2021 • Notícias • Português
Artur Burigo
O impacto do fim da isenção de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) para materiais de saúde em São Paulo pode ser ainda maior para o consumidor do que a alíquota de 18% que passou a incidir sobre a maioria desses produtos a partir deste ano.
Essa é a avaliação de entidades que representam indústrias e distribuidoras do setor. O superintendente da Abimo (Associação Brasileira da Indústria de Artigos e Equipamentos Médicos e Odontológicos), Paulo Henrique Fraccaro, explica que as distribuidoras só recebem o pagamento dos hospitais entre 90 e 120 dias depois da entrega, mas têm de arcar com a alíquota do ICMS no momento em que emitem a nota fiscal. “Essa diferença irá gerar um custo financeiro. Os distribuidores devem repassar não os 18% do ICMS, mas 20% a 22% na venda dos produtos”, diz. O fim da isenção de ICMS em São Paulo incide sobre mais de 200 materiais médicos. Produtos como stents coronarianos, marcapassos, grampeadores cirúrgicos e cateteres balão eram isentos e passaram a ter cobrança de 18% a partir de 1º de janeiro. Agulhas e seringas descartáveis tinham uma alíquota de 12% e agora têm cobrança de 13,3%.
Produtos ortopédicos, que não tinham cobrança do imposto estadual, passaram a ser taxados em até 18%. Válvulas cardíacas biológicas, usadas em aproximadamente 10 mil cirurgias por ano no SUS (Sistema Único de Saúde), tinham valor médio de R$ 1.530. Com o aumento de ICMS, passarão para R$ 1.800, de acordo com a fabricante Braile Biomédica, empresa de São José do Rio Preto (SP) especializada em produtos para cirurgias cardíacas, endovasculares e oncológicas. A alteração da alíquota de ICMS também impactou os medicamentos. De acordo com o Sindusfarma (Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos), o mesilato de imatinibe, para terapia oncológica, passou de R$ 169.032,83 para R$ 192.082,76, um aumento de R$ 23 mil. A Secretaria da Fazenda do governo de São Paulo informou, em nota, que medicamentos de alta complexidade que combatem Aids, câncer, entre outras doenças, continuarão tendo a distribuição gratuita na rede pública. Segundo a pasta, os materiais e insumos que passam a ser tributados a 18% são aqueles que encontram equivalentes na rede pública.
O diretor-executivo da Abraidi (Associação Brasileira de Importadores e Distribuidores de Produtos para Saúde), Bruno Bezerra, explica que a isenção da rede pública de hospitais e das Santas Casas gera um crédito tributário para as distribuidoras no momento da venda dos materiais, mas afirma que esse crédito vai se tornar custo. “O distribuidor não tem fluxo de caixa robusto para esperar, muitas vezes, anos até receber esses valores”, diz Bezerra. “No papel, a isenção faz sentido, mas na realidade, não funcionará.” Ele questiona o anúncio de que haveria um corte linear de 20% sobre os benefícios tributários para os setores. “No nosso caso, muitos produtos eram desonerados, ou seja, passaram de uma alíquota zerada para 18%, que é um aumento muito maior que 20%.”
Para as entidades, o provável aumento de preços gerado pelo fim da isenção de ICMS deve impactar a demanda pela rede pública de hospitais. “O setor de saúde opera no limite. Haverá aumento de preços nos planos de saúde, o que provocará uma migração maior de pessoas do sistema privado para o público”, prevê Fernando Silveira Filho, presidente-executivo da Abimed (Associação Brasileira da Indústria de Alta Tecnologia de Produtos para Saúde).
Marco Novais, superintendente-executivo da Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde), concorda que os atores que compõem o setor não têm condições de represar o fim da isenção de ICMS, e aponta que a cobrança vem em um cenário de aumento natural de preços por conta da alta demanda de produtos de saúde em razão da pandemia. “Os insumos ficaram mais caros, e esses preços provavelmente não vão retornar ao patamar anterior”, afirma Novais.
Para a Secretaria da Fazenda, a revisão de benefícios fiscais não atingirá a rede pública, pois o governo garantiu a manutenção da isenção para medicamentos genéricos, assim como para todas as compras de hospitais públicos, Santas Casas e rede de atendimento do SUS. A administração estadual afirma ainda que “a rede particular já costuma onerar os consumidores, apontando como argumento que os planos de saúde tiveram reajuste de 8,14% sobre os planos individuais e de 15% sobre os planos coletivos, valores acima da inflação”. Nos cálculos do governo, o ajuste fiscal irá gerar R$ 7 bilhões em recursos, que ajudarão a cobrir o rombo das contas públicas causado pela pandemia.
Fonte: Folha de S.Paulo